Izaura da Silva Cabral
(UFRGS/CAPES)
RESUMO
No Brasil, um dos precursores da literatura infantil
é Monteiro Lobato, que aproveitou algumas das características experimentadas
por outros e o fato de a escola da época estar começando a inserir os livros de
leitura no cotidiano escolar, para produzir livros destinados aos pequenos.
Dessa forma, analisaremos a construção de sua obra infantil, especialmente as
descobertas sobre a preferência dos leitores infantis durante os anos 20 e 30,
claramente registrada nas reedições de suas obras. Tomaremos como corpus da
nossa pesquisa as edições de A menina do
narizinho arrebitado (1920) e o primeiro capítulo “Narizinho arrebitado”
(1934) de Reinações de Narizinho. A
partir da análise, pode-se verificar as razões que levaram Monteiro Lobato a
realizar alterações visando atingir o leitor infantil, resultado que o
consagrou como um dos maiores autores da literatura infantil brasileira de
todos os tempos.
Palavras-chave: 1Literatura infantil; 2 Monteiro
Lobato; 3 Reinações de Narizinho; 4 Leitor infantil; 5 Anos 20 e 30.
ABSTRACT
In
Brazil, one of the forerunners of children's literature is Monteiro Lobato, who
took some of the characteristics experienced by others and the fact that the
school season is starting to enter the reading books in the school routine, to
produce books for the little ones. Thus, we analyze the construction of its
child labor, especially the findings on the preference of the child readers
during the '20s and '30s, clearly recorded in editions of his works. We will
take as our research corpus editions of A
menina do narizinho arrebitado (1920) and the first chapter "Narizinho
arrebitado" (1934) of the Reinações
de Narizinho. From the analysis, it can be seen the reasons Monteiro Lobato
to make changes in order to reach the child reader, the result established
himself as one of the greatest authors of Brazilian children's literature of
all time.
Keywords:
1Literatura child; 2 Monteiro Lobato; 3 Reinações de Narizinho; 4 Reader
children; 5 Years 20 and 30.
1
Introdução
A literatura infantil como gênero tem uma história bastante recente, uma
vez que o seu surgimento está diretamente ligado à história da infância, a
partir do momento em que a criança passou a ser vista como um ser em formação e
necessitava uma produção cultural adequada a seu nível intelectual e social. No
Brasil, um dos precursores da literatura infantil é Monteiro Lobato, que
aproveitou algumas das características experimentadas por outros escritores e
pelo fato de a escola da época estar começando a inserir os livros de leitura. Levando
em consideração o contexto, e com o propósito de realizar esse ensaio
analisaremos os primeiros passos de Lobato na construção de sua obra infantil,
especialmente as descobertas sobre a preferência dos leitores infantis durante
os anos de 20 e 30, claramente registrada nas reedições de suas obras, bem como
suas descobertas a cerca das características dos livros que agradam ao leitor
criança até hoje. Tomaremos como corpus da nossa pesquisa as edições de A menina do narizinho arrebitado (1920) e
o primeiro capítulo “Narizinho arrebitado” (1934) de Reinações de Narizinho. Ainda, a partir da análise, pretendemos entender
as razões que levaram Monteiro Lobato a realizar alterações visando atingir o
leitor infantil, resultado que o consagrou como um dos maiores autores da
literatura infantil brasileira de todos os tempos.
Nas últimas décadas do
século XIX, no Brasil, houve a ascensão da classe média urbana. Essa classe
média responsabiliza-se pelas mudanças ocorridas no país, e em nome dela,
revoluções, avanços e retrocessos ocorrem. O aparecimento dos primeiros livros
para crianças incorpora-se a esse processo, porque atende às solicitações indiretamente
formuladas pelo grupo social emergente. Tendo em vista que não havia nada
especialmente produzido aos pequenos, a maneira encontrada para atingir esse
público foi traduzir obras estrangeiras, adaptar obras destinadas originalmente
aos adultos, reciclar material escolar, já que os leitores que formavam o
crescente público eram igualmente alunos e estavam se habituando a utilizar o
livro didático, apelar para a tradição popular, confiando em que as crianças
gostariam de encontrar nos livros histórias parecidas àquelas que as mães,
amas-de-leite, escravas e ex-escravas contavam em voz alta, desde quando elas
eram bem pequenas. Podemos dizer que a tradição popular trouxe contribuições
para o surgimento de uma literatura destinada aos pequenos, assim como os contos
de fadas europeus que continuam sendo lidos até hoje.
Dessa maneira, vários
foram os autores brasileiros que traduziram ou adaptaram obras para as
crianças, seguindo modelos europeus, os precursores foram Carl Jansen, Olavo
Bilac e Figueiredo Pimentel (1869-1914) que publicou coletâneas de muito
sucesso, como os Contos da Carochinha
(1894), em que encontram as histórias de fada européias, ao lado de
narrativas coletadas entre os descendentes dos povoadores do Brasil. Assim foi
como a tradição oral e popular se enraizou no Brasil para não mais sair, e
Lobato foi o sucessor desse núcleo original.
2 Buscando o leitor
infantil
Esse núcleo original
deixou heranças a seu sucessor, como já dissemos, com personagens e histórias
da tradição oral, que foram contribuindo para que Lobato empreitasse seus
primeiros passos na produção de livros para as crianças. Ele foi o homem das revoluções. O arranco que deu na
indústria livreira nacional foi uma delas. As outras foram à luta pelo petróleo
e a literatura infantil. Antes dele não existia a literatura como atividade
comercial. Escrevia-se para entrar na Academia, para se tornar imortal. Para
isso, escrevia-se numa linguagem empolada que tinha como objetivo não agradar
ao leitor, mas fazer gênero. O criador do Sítio odiava isso. A desgraça da
maior parte dos livros é o excesso de literatura, e esse é um dos objetivos do
autor, extrair toda a “literatura” de seus livros, construindo livros em que as
crianças pudessem morar.
Podemos perceber a preocupação com a criança e a visão da infância
tipicamente moderna para a época, como destaca Nunes (1986, p. 48), em uma
carta de Lobato a Vicente Guimarães em doze de janeiro de mil novecentos e
trinta e seis: “uma coisa que sempre me horrorizou foi ver o descaso do
brasileiro pela criança, isto é, por si mesmo, visto como a criança não passa
da nossa projeção para o futuro”. Para Lobato a criança era um público em
potencial e necessitava de leitura apropriada à fase que se encontrava e a seu gosto.
Dessa
maneira, o autor inicia suas primeiras produções infantis como destaca Cavalheiro
(1956), contando que a ideia da primeira historia infantil escrita pelo autor
teria surgido em 1920, quando ele era também editor:
Certa
tarde, na Editora, joga xadrez com Toledo Malta, quando no intervalo entre dois
lances, este lhe conta a história de um peixinho que por haver passado um tempo
fora d’água “desaprendera a nadar”, e de volta ao rio afogara-se. “Perdi a
partida de xadrez naquele dia, talvez menos pela perícia do jogo do Malta do
que por causa do peixinho. O tal peixinho pusera-se a nadar em minha imaginação,
e quando Malta saiu, fui para a mesa e escrevi a “Historia do Peixinho que
Morreu Afogado” – coisa curta. Do tamanho do peixinho. Publiquei isso logo
depois, não sei onde. Depois veio-me a ideia de dar maior desenvolvimento a
historia, e ao fazê-lo acudiram-me cenas da roca, onde eu havia passado a minha
meninice.
Conforme
Arroyo (1968, p. 200), a partir do pequeno conto “A história do peixinho que
morreu afogado” Lobato começa a reviver histórias de sua infância na roça e
cria personagens e ambientes que o remetiam a pessoas como a “mulata Joaquina”,
com quem ia pescar lambaris no Ribeirão; da primeira entrada na floresta em
companhia do pai; das brincadeiras com as irmãzinhas; das histórias contadas
por Evaristo. As cenas foram vindo à tona em sua memória, e quando se deu por
conta, produzia as primeiras linhas da grande obra destinada aos pequenos, como
aponta Cavalheiro (1956):
“Naquela
casinha branca, lá muito longe, mora D. Benta de Oliveira, uma velha de mais de
setenta anos”. Por que velha? Por que Benta? Velha, porque se iam entrar
crianças, era preciso botar uma velha, uma vovó, pois só as vovós aturam
crianças e deixam-nas fazer o que querem. E Benta, por que? Num colégio em que
estivera em Taubaté, havia um rapaz de nome Pedro de Castro, que às vezes
contava histórias de sua avó Benta, lá de Macaé. E o conto foi brotando, ao
sabor da fantasia, um pedaço hoje, outro amanhã, os intervalos que, no
escritório, lhe deixavam as partidas de xadrez (...)
De acordo com Arroyo (1968, p. 200) com essa
história do peixinho nasceu o livro A
menina do Narizinho Arrebitado, o peixinho puxou a imaginação do escritor,
e a obra foi muito bem recebida, Bruno Ferraz (apud Cavalheiro: 1962, p.
146-150). Em 1920, Lobato publica então seu livro dedicado aos pequenos, com capa
ilustrada a partir de desenhos feitos por Voltolino.
Capa de fac-símile da primeira edição
de A menina do narizinho arrebitado.
Muitos, na época manifestaram a sua opinião
sobre a nova obra que era lançada, inclusive Menotti del Picchia foi um deles,
publicando-a jornal Correio Paulistano,
de 23/12/1920:
Um
belo presente de Natal de 1920 para esses milhões de serezinhos que ainda
acreditam em sortilégios e fadas. Senhor de um mágico estilo, feito para
deslumbrar adultos, soube – e nisto está o grande elogio da sua obra – criar
uma linguagem comovida e simples para, com ela nivelado em nossos pequerruchos,
falar à ingênua imaginação das crianças.
Depois de ser publicado
como livro, no final de 1920, com o título A
menina do narizinho arrebitado, a obra aparece em episódios (como
continuação do livro publicado em 20), na Revista
do Brasil, em 1921, sendo que alguns dos episódios são publicados na
revista sob o título Lúcia ou A menina do narizinho arrebitado.
Em carta ao amigo e
professor Godofredo Rangel, Lobato manifesta a ideia de testar o livro na
escola e decide realizar uma campanha pela leitura escolar. Segundo Arroyo
(1968, p. 204), Lobato não escrevia à toa para Rangel, ele queria a impressão
de professor acostumado a lidar com crianças. A sua obra com o título de Narizinho arrebitado é aprovado pelo
governo de São Paulo para uso em escolas públicas. E em 1921 sai uma edição de
50.500[1]
exemplares com as ilustrações em preto e branco de Voltolino, feita de papel
jornal.
Durante os anos 20 e
30, Lobato continuou publicando livros, clássicos da literatura infantil, como
Grimm, Andersen e Perrault. Seu entusiasmo não se restringiu a essas
publicações, pois em 1934 nasceu a sua ideia de reunir as várias aventuras de
Narizinho, que segundo Arroyo (1968, p. 205), foram pequenos tomos intitulados
Narizinho Arrebitado (1921), Noivado de Narizinho (1928), Aventuras do Príncipe
(1928), Pena de Papagaio, Gato Félix, Cara de Coruja, O Irmão de Pinóquio, O
circo dos Escavalinhos, Pó de Pirlimpimpim, No País das Abelhas e Novas
Reinações de Narizinho, que como disse o próprio Lobato (1944, p. 495) seria a
“consolidação num volume grande dessas aventuras que tenho publicado por
partes, com melhorias, aumentos e unificação num todo harmônico”.
O exame dessas
alterações feitas nas primeiras obras infantis publicadas por Lobato pode ser
revelador no sentido de nos apontar o seu caminho para o sucesso, como escritor
da literatura infantil brasileira, poderemos observar como ele lapidou seu
estilo sempre com um único objetivo, o de conquistar o leitor criança. Dessa
forma, vamos iniciar a análise pelo primeiro parágrafo da obra, que apresenta
os protagonistas da história.
A
menina do narizinho arrebitado (1920)
|
Narizinho arrebitado (1934)
|
Naquela casinha branca, - lá muito longe, mora uma triste
velha, de mais de setenta anos. Coitada! Bem no fim da vida que está, e
tremula, e catacega, sem um só dente na boca – jururu... Todo o mundo tem dó
d’ela:
- Que tristeza
viver sozinha no meio do mato...
|
Numa casinha branca, lá no sitio do Picapau Amarelo, mora
uma velha de mais de sessenta anos. Chama-se dona Benta. Quem passa pela
estrada e a vê na varanda, de cestinha de costura e óculos de ouro na ponta
do nariz, segue seu caminho pensando:
― Que tristeza viver assim tão sozinha nesse deserto...
|
Podemos analisar
algumas alterações como o espaço, que de um modo realista, se apresentava
próximo e visível ao leitor “naquela casinha branca”, torna-se distante, indeterminado
como nos contos populares ou maravilhosos “numa casinha branca, lá no Sítio do
Picapau Amarelo”. Quanto ao aspecto observado, podemos dizer que a
característica de espaço e tempo indeterminados é uma dos elementos que agrada
aos pequenos leitores, já os conceitos ainda não foram construídos pela
criança, na infância ainda não há diferenças claras entre o “aqui” e o “lá”,
sendo absolutamente possível descolar-se de um para outro sem perceber a
distância
Além disso, as personagens passam para uma dimensão
afetiva, tornando-se mais próximas do leitor, proporcionando uma maior
identificação. D. Benta, em lugar de “uma triste velha [...] trêmula e
catacega”, passa a ser apresentada como “uma velha de mais de sessenta anos”
muito ativa com suas costuras e “óculos de ouro na ponta do nariz”. Os adjetivos foram enxugados; a
velhinha “triste” e “coitada”, “quase no fim da vida” da primeira edição
desaparece. A descrição de características físicas – “trêmula”, “catacega”,
“sem um dente na boca” – dá lugar a apresentação nominal “chama-se Dona Benta”,
e esta pode ser outra característica que agrada ao leitor, de acordo com Cabral
(2007, p.84), “na análise de personagens, um dos primeiros signos
que aparece é o nome próprio, que oferece uma dimensão conotativa, pois destaca
a intensidade nominal e dela faz derivar a função narrativa”, além disso, a
partir disso a “a criança pode encontrar na ficção a situação próxima dela,
contribuindo para uma maior identificação com o relato”.
Inclusive,
a velha está com uma cestinha de costura, o que indica a prática de um trabalho
que exige firmeza das mãos; e o enfraquecimento da visão, antes apresentado
negativamente – ela é “catacega”. Apesar das alterações, Dona Benta continuou
sendo a primeira personagem a aparecer na história.
Durante os
anos que passaram desde a publicação de A
menina do narizinho arrebitado em 1920, mesmo com a descrição que apresenta
uma avó mais ativa, talvez tenha sido necessário rejuvenescê-la, ainda que na
versão compilada de1934, sua idade continue não explicitada, é diminuída: ela
passa a ter “mais de sessenta anos”, em lugar de “mais de setenta”.
A menina do
narizinho arrebitado
|
Narizinho arrebitado
|
Pois estão enganados. A velha vive feliz e bem contente da
vida, graças a uma netinha órfã de pai e mãe, que lá mora des’que nasceu.
Menina morena, de olhos pretos como duas jaboticabas – e reinadeira até ali!...
Chama-se Lúcia, mas ninguém a trata assim. Tem apelido. Yayá? Nenê? Maricota?
Nada disso. Seu apelido é “Narizinho Arrebitado”, - não é preciso dizer
porquê.
|
Mas engana-se. Dona Benta é a mais feliz das vovós, porque
vive em companhia da mais encantadora das netas – Lúcia, a menina do narizinho
arrebitado, ou Narizinho, como todos dizem. Narizinho tem sete anos, é morena
como jambo, gosta muito de pipoca e já sabe fazer uns bolinhos de polvilho
bem gostosos.
|
Nas duas
versões a razão da alegria de dona Benta é a neta. Entretanto, há algumas
diferenças significativas relacionadas à maneira como a menina é apresentada ao
leitor. A orfandade de Narizinho “netinha órfã de pai e mãe”, mencionada na
primeira versão, fica apenas implícita na última. Outro aspecto a ser notado é
o modo como o autor introduz o apelido da personagem, na versão de 1920, o
narrador, chamando o leitor para o diálogo, sugere três nomes antes de dar a conhecer
o apelido “Narizinho Rebitado”: Yayá, Nenê e Maricota.
Narizinho deixa de ser
a netinha órfã, não mais mostrando logo no início que a personagem poderia ser
triste com sua situação, apresentada como “menina morena, de olhos pretos como
duas jaboticabas – e reinadeira até ali!”, para aparecer com uma personalidade
ativa e positiva: “a mais encantadora das netas [...] tem sete anos e morena
como jambo, gosta muito de pipoca e já sabe fazer bolinhos de polvilho bem
gostosos”. Sua idade
– explícita na versão final – antecipa a descrição de suas qualidades como
vimos. Além
da idade que identifica o leitor, também podemos observar a presença de
alimentos tipicamente populares.
A menina do narizinho arrebitado
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Narizinho arrebitado
|
Além de Lúcia, existe na casa a tia
Nastácia, uma excelente negra de estimação, e mais a Excelentíssima Senhora
Dona Emília, uma boneca de pano, fabricada pela preta e muito feiosa, a
pobre, com seus olhos de retrós preto e as sobrancelhas tão lá em cima que é
ver uma cara de bruxa.
Mas, apesar disso, Narizinho quer
muito bem à Sra. Dona Emília, vive a conversar com ela e nunca se deita sem
primeiro acomodá-la numa redinha armada entre dois pés de cadeira.
Fora esta bruxa de pano, o outro
encanto de Narizinho é um ribeirão que passa ao fundo do pomar de águas tão
claras que se vêem as pedras do fundo e toda a peixaria miúda.
|
Na casa ainda existem duas pessoas –
tia Nastácia, negra de estimação que carregou Lúcia em pequena, e Emília, uma
boneca de pano bastante desajeitada de corpo. Emília foi feita por tia
Nastácia, com olhos de retrós preto e sobrancelhas tão lá em cima que é ver
uma bruxa.
Apesar disso Narizinho gosta muito
dela; não almoça nem janta sem a ter ao lado, nem se deita sem primeiro
acomodá-la numa redinha entre dois pés de cadeira.
Além da boneca, o outro encanto da
menina é o ribeirão que passa pelos fundos do pomar. Suas águas muito
apressadinhas e mexeriqueiras correm por entre pedras negras de limo, que
Lúcia chama as “tias Nastácias do rio”.
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Tia Nastácia, de “excelente
negra de estimação”, é vista como “a negra de estimação que carregou Lúcia em
pequena”. Podemos dizer que “Tia Nastácia” é o símbolo idealizado da raça
negra, afetuosa e humilde, que está em nossa gênese de povo e foi a melhor
fonte de histórias que alimentaram a imaginação e a fantasia de gerações e
gerações de brasileiros. Aos que chamaram Lobato de racista, por criar essa
personagem preta e ignorante, não perceberam que dentro de seu universo
literário não há preconceito racial nenhum, já que ela é amada e respeitada por
todos.
Emília que nesse livro
ainda não havia sido realmente descoberta por Lobato, surge como “Senhora Dona
Emília”, cheia de tratamentos formais e passa a simplesmente “Emília” –
tratamento mais familiar ficando sem alteração nos outros aspectos – mandona,
mas brejeira.
O espaço, representado
pelo ribeirão (tão importante na primeira edição), vai ser alterado
substancialmente. Suas “águas tão claras que se veem as pedras do fundo e toda
a peixaria miúda”, transformaram-se em “águas muito apressadinhas e
mexeriqueiras, correndo por entre pedras
negras de limo”. Torna-se assim, mais verossímil essa versão do ribeirão,
pois tendo “águas tão claras” que deixavam ver “toda a peixaria miúda”, é de se
supor que o “Reino das Águas Claras” também deveria ser ali visível. Com a
menção das águas correndo entre “pedras negras de limo”, automaticamente no
espírito do leitor, as águas se escurecem e obviamente escondem o que se passa
no fundo do ribeirão.
A
menina do narizinho arrebitado
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Narizinho
arrebitado
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Não se passa um dia
sem que Lúcia vá sentar-se à beira d’água, na raiz de um velho ingazeiro, ali
ficando horas, a ouvir o barulhinho da corrente e a dar comida aos peixes. E
eles bem que a conhecem! É vir chegando a menina e todos lá vêm correndo, de
longe, com as cabecinhas erguidas, numa grande faminteza. Chegam primeiro os piquiras, os guarus barrigudinhos, de olhos saltados; vêm depois os lambaris ariscos de rabo vermelho; e
finalmente uma ou outra parapitinga
desconfiada.
|
Todas as tardes Lúcia toma a
boneca e vai passear à beira d’água, onde se senta na raiz de um velho
ingazeiro para dar farelo de pão aos lambaris.
Não há peixe do rio que a
não conheça; assim que ela aparece, todos acodem numa grande faminteza. Os
miúdos chegam pertinho; os graúdos parece que desconfiam da boneca, pois
ficam ressabiados, a espiar de longe.
|
No todo, as alterações da primeira para a versão
final revelam uma tentativa de tornar o popular e o afetivo mais presentes na
narrativa. Além disso, a intenção didática na primeira versão se atenua ou
praticamente desaparece na última. Notemos, por exemplo, a distância que vai
entre um texto e outro na apresentação dos peixes do ribeirão.
Os nomes dos peixes
foram retirados e passam a ser caracterizados pelo porte ou comportamento. Na
verdade, para as crianças, a nomenclatura que designa as espécies de peixes não
tem a menor importância, isso é matéria de escola, além de ser um elemento a
pesar na frase e na percepção da cena, sem lhe acrescentar nada. Inclusive,
nesse trecho, já se percebe o maior espaço que a boneca vai ter no universo
lobatiano: na primeira versão nem é mencionada na cena; na segunda, já atua
sobre o comportamento
dos
peixes “alguns desconfiam da boneca, pois ficam ressabiados, a espiar de longe”.
Além disso, podemos
notar que Lobato preservou traços como a criação de palavras nas duas versões,
como por exemplo, “faminteza”, para mostrar que os peixes tinham muita fome.
Essa estratégia agrada ao leitor infantil por ser esta uma característica
tipicamente infantil, a criação de palavras para dizer o que querem, por que
muitas vezes não encontram a palavra apropriada, já que não possuem um
vocabulário tão amplo quanto ao do adulto.
A menina do narizinho arrebitado
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Narizinho arrebitado
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- A entrada do meu
reino é por aqui – disse Escamado, apontando uma furna entre as pedras e
dando a mão à menina para ajudá-la a subir. Entraram. Mas a escuridão era
pior que a de uma noite sem estrelas, e Narizinho parou, cheia de medo. O
peixinho sorriu e disse:
- Os filhos dos
homens só enxergam quando há luz, mas os filhos das águas são como as
corujas: tanto vêem no claro como no escuro. E puxou do bolso um vagalume de
olhos acesos, pendurado num cabinho de arame. A caverna clareou à luz da
lanterna viva, e Narizinho pôde ver que se achava num corredor comprido,
espécie de túnel...
|
- É aqui a entrada
do meu reino – disse o príncipe.
Narizinho espiou, com
medo de entrar.
- Muito escura,
príncipe. Emília é uma grande medrosa.
A resposta do
peixinho foi tirar do bolso um vaga-lume de cabo de arame, que lhe servia de
lanterna viva. A gruta clareou até longe e a “boneca” perdeu o medo.
Entraram...
|
Podemos perceber que
“Escamado”, na última versão, passa a ser chamado de “príncipe”, é esta outra
maneira de aproximar o texto lobatiano aos contos de fadas, em que os príncipes
não recebem nomes, apenas são príncipes e isso já basta para tornarem-se
encantadores para os leitores infantis. Nesse trecho, da primeira versão,
Emília nem é mencionada, já na de 1934, talvez Lobato, depois de ter escrito
outros textos com a boneca muito atuante e que fizeram sucesso, tenha sacado
que Emília era um elemento que desencadeava a imaginação das crianças, e passa
a introduzi-la a todo o momento na narrativa. Inclusive aqui também podemos
perceber a retirada da parte pedagógica do texto uma vez que todo trecho a
seguir é retirado da última versão “os filhos dos homens só enxergam quando há
luz, mas os filhos das águas são como as corujas: tanto vêem no claro como no
escuro”. Ainda a idéia de usar o vagalume para iluminar a gruta é uma grande
diversão e essa permanece nas duas versões.
A menina do
narizinho arrebitado
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Narizinho
arrebitado
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- Bela coisa,
mestre Agarra. Vestido de mulher. Você o guarda do palácio!
- Vestido de
mulher? Eu? – disse o sapo espantado.
- Mire-se neste
espelho – disse o príncipe. Só então o sapo percebeu a judiaria de que tinha
sido vítima. Ficou apalermado, a olhar para o príncipe, para a menina e para
o espelho, sem nada compreender do caso.
|
- Bela coisa,
Major! Dormindo como um porco e ainda por cima vestido de velha coroca... Que
significa isto?
O sapo, sem
compreender coisa nenhuma, mirou-se apatetadamente num espelho que havia por
ali. E botou a culpa no pobre espelho.
|
Aqui, na versão de 1934 o
nome do sapo desaparece e ele é chamado de Major. A cena do sapo “vestido de
mulher” é enriquecida pelo fato dele estar “dormindo como um porco e ainda por
cima vestido de velha coroca...”. Esses aspectos contribuem para que o texto se
torne mais atraente para as crianças, reforçando a presença do humor. Além
disso, para
Sandroni (1987, p. 59), o humor, a ironia e a crítica são também meios para
reflexão na obra, o que pode proporcionar uma maior emancipação do leitor. O humor é gerado aqui pelo non-sense, que concebe o sapo como
guarda do reino. De acordo com Chevalier e Gheerbrant (1998, p. 803), o medo do
sapo faz dele um símbolo de fealdade e de falta de jeito, caracterizando a.
Para Ana Maria Machado (2002, p. 20), a simples
idéia de uma boa brincadeira proporcionada pela leitura também tem seu
fundamento e pode ir além do mero entretenimento ou da diversão superficial e
descartável. Quando brinca, a criança faz-de-conta. Fantasia, imagina, finge –
cria uma ficção.
A menina do
narizinho arrebitado
|
Narizinho
arrebitado
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Quero uma grande
festa como nunca houve igual. Avise a corte e dê as ordens necessárias, mas
antes de nada, mande vir o coche real.
O capitão saudou
militarmente e saiu acompanhado dos guardas.
Não demorou muito e
uma carruagem apareceu à porta, puxada por três parelhas de lambaris.
Servia de cocheiro
um belo camarão de libré vermelha, muito teso no alto da boleia. Mal o
príncipe e a menina entraram na carruagem, mestre Camarão estalou o chicote e
os lambaris partiram como raios.
|
- Mande convite a
todos os nobres da corte para a grande festa que vou dar amanhã em honra à
nossa distinta visitante. E diga a mestre Camarão que ponha o coche de gala
para um passeio pelo fundo do mar. Já.
|
Nos trechos acima, podemos
perceber a preocupação com a diminuição das descrições. Lobato com sua
constante vontade de atrair mais leitores infantis, transforma o fragmento em
apenas uma fala em discurso direto, o que traz mais dinamismo à leitura, e que
deixa de lado as maçantes descrições que desagradam à criança leitora.
A menina do
narizinho arrebitado
|
Narizinho
arrebitado
|
Narizinho
não cabia em si de gosto e mirando-se, ao espelho, duvidava dos próprios
olhos.
-
Serei eu mesma ou uma fada das mil e uma noites?
(...) a orquestra rompeu a Valsa Real e o príncipe,
levantando-se, disse a menina:
- É
chegada a nossa vez. Quer dar-me a honra desta valsa?
Narizinho,
que não queria outra coisa, desceu do trono e nos braços do príncipe rodopiou
pela sala em giros tão velozes que mais parecia um pião vivo.
|
Narizinho
vestiu-se, indo ver-se ao espelho.
― Que
beleza! exclamou, batendo palmas.
Estou que
nem um céu aberto!
E estava
mesmo linda. Tão linda no seu vestido de teia cor-de-rosa com estrelinhas de
ouro, que até o espelho arregalou os olhos, de espanto. (...)
Narizinho
e o príncipe dançaram a primeira contradança sob os olhares de admiração da
assistência. Pelas regras da corte, quando o príncipe dançava todos tinham de
manter-se de boca aberta e olhos bem arregalados. Depois começou a grande
quadrilha. Foi a parte de que Narizinho gostou mais. Quantas cenas
engraçadas!
|
Na edição
de 1920, o maior desejo da menina é dançar nos braços do príncipe e não cabe em
si de tanta alegria: “- Serei eu mesma uma fada das mil e uma noites?”. Como a
idade da menina não é explicita, a cena se torna mais romântica e ela se
comporta como se fosse uma princesa jovenzinha dos contos de fadas.
Na versão
de 1934, “a parte” de que ela mais gosta não é nada romântica, são as cenas engraçadas
provocadas pelos animaizinhos da corte, que dançam ao redor: “todos tinham de
manter-se de boca aberta e olhos bem arregalados”. Os esboços de princesa de
conto de fadas da “primeira” Narizinho diluem-se a ponto de quase desaparecerem
sob a ótica da transformação imperada por Lobato, caracterizado-a como um
criança que se diverte para valer com as cenas engraçadas que presencia. Aqui
também podemos destacar a sacada que o autor teve de colocar a menina como
protagonista da história, visto que a criança na época ainda não era vista como
potencial leitor, ele antecipou-se e colocou os pequenos como centro do enredo,
capazes de brincarem e divertirem-se até mesmo através da leitura. Assim a
infância passa a ter voz.
A menina do
narizinho arrebitado
|
Narizinho
arrebitado
|
... toda perturbada, ia responder,
quando uma voz conhecida a despertou: - Narizinho, vovó está chamando!
A menina sentou-se na relva,
esfregou os olhos, viu o ribeirão a deslizar como sempre e lá na porteira a
tia velha do lenço amarelo na cabeça. Que pena! tudo aquilo não passara dum
lindo sonho...
|
...Mas assim que entrou na sala de
baile, rompeu um grande estrondo lá fora – o estrondo duma voz que dizia: -
Narizinho, vovó está chamando!...
Tamanho susto causou aquele
trovão entre os personagens do reino marinho, que todos sumiram, como por
encanto. Sobreveio então uma ventania muito forte, que envolveu a menina e a
boneca, arrastando-a do fundo do oceano para a beira do ribeirãozinho do
pomar.
Estavam no sítio de Dona Benta
outra vez!
|
Na primeira edição o
autor valia-se da fantasia, mas ao mesmo tempo disciplinava-a com a lógica,
como podemos ver no exemplo em que a aventura de Narizinho no Reino das Águas
Claras termina no momento em que ela vai responder ao príncipe Escamado que a pede
em casamento. Esclarecendo, nesse final que tudo não passara de um sonho,
Lobato anula a presença do maravilhoso dentro do cotidiano. Deixa que predomine
o pensamento racional sobre o pensamento mágico. O autor ainda não havia
percebido que para a criança não há a separação entre os dois pensamentos e que
eles podem conviver harmoniosamente.
Já na edição de 1934, o
real invade o fantástico quando em meio ao baile rompeu uma voz que chamava por
Narizinho, voz comparada a um trovão e como por encanto todos os personagens do
reino sumiram. Uma grande ventania trouxe as personagens de volta para casa.
Essa é uma característica que agrada ao leitor infantil, já que para a criança
em meio ao faz-de-conta tudo é possível, seres fantásticos visitarem o mundo real
e vice-versa. Inclusive a viagem da personagem também pode representar o
deslocamento do mundo real para uma aventura distante de casa, distante do
conhecido. A presença desses elementos em textos que se tornaram clássicos pode
demonstrar que as crianças de todos gostam de se aventurar pelo desconhecido,
sair para longe de casa, mesmo que seja somente através da leitura, mas
geralmente retornam, como é o caso de Narizinho e também de outras crianças
protagonistas de textos clássicos infantis, como Peter Pan em Peter Pan, Dorothy em O mágico de Oz, Alice em Alice no país das maravilhas, Tom Sawyer
em As aventuras de Tom Sawyer e
tantos outros.
Durante a década que se
passou desde a publicação de A menina do
narizinho arrebitado Lobato passou a conviver mais com as crianças e a
observar através da leitura de seu livro escolar, o gosto infantil. A partir
desse momento, ele vai conquistando seu estilo, ao se tornar consciente de que
o mundo da criança é diferente daquele que o adulto vê. Cada vez mais se deixa
contagiar pelo universo infantil (onde o real e o maravilhoso não se
diferenciam...), e recorre aos cortes, reescritas e novas edições dos livros já
publicados.
Além de todos os
aspectos, podemos salientar que Lobato, na edição final, suprime cenas de violência
e que tratam de críticas ao catolicismo, como um capítulo chamado de “A
enfermaria”. Na primeira versão temos a presença da pena da morte, chacinas e
um vilão chamado de “Escorpião Negro”, já na última, o papel do vilão é
assumido pela Dona Carochinha, que recebe as críticas das personagens por
apresentar histórias emboloradas e ultrapassadas para as crianças.
Conforme Cabral (2007),
muitas vezes, as narrativas mirins criticam as instituições voltadas aos
pequenos. Nesse caso, a crítica recai sobre as histórias que não agradam ao
leitor infantil, principalmente aquelas com personagens autoritários como Dona
Carochinha, que, por essa característica, se tornam ultrapassadas: “Dobre a
língua! – gritou vermelha de cólera. Velha coroca é vosmecê, e tão implicante
que ninguém mais quer saber das suas histórias emboloradas”.Da mesma forma
Marçolla (2003), nos aponta que Lobato ao falar das histórias de dona Carochinha, antigas e com pouco
significado, porque eram traduzidas ao pé da letra, sem a busca de adequação à
língua, apresenta essas críticas, mostrando a revolta dos personagens da
própria obra, levando ao exagero, pois nem eles se suportam mais, guardados nos
velhos livros.
Algumas das alterações
efetuadas por Monteiro Lobato, conforme Marçolla (2003) mostram “a sua
preocupação ao entrar no mundo das crianças, através da literatura, pois a
responsabilidade do escritor seria redobrada ao discutir temas impróprios aos
seus leitores, disfarçados por elementos mágicos ou maravilhosos”.
3
Considerações finais
Para Zilberman (2005,
p. 21), “um escritor é muito popular, quando o mundo que criou escapa a seu
controle, como se as personagens vivessem independentemente dele”. Lobato pode
não ter inventado a técnica de reunir um grupo de figuras com grande presteza
para a ação, mas a grande construção lobatiana foi os atributos que ele
conferiu a seus personagens: primeiramente, os principais agentes são crianças,
ou mimetizam o comportamento delas, sendo que o universo das personagens
aproxima-se do mundo do leitor e permite identificação imediata; em segundo
lugar, trata-se de um conjunto de seres inteligentes e independentes, dispondo
de ampla liberdade para tomar iniciativas, inventar ações originais e resolver
problemas, abordam os adultos de igual para igual; por último, as crianças são
figuras inseridas na vida brasileira, o que lhes confere autenticidade e
nacionalidade, reagem às dificuldades de seu e de nosso tempo, o que mais uma
vez facilita a aproximação entre as personagens e o leitor.
Para Ana Maria Machado
(2002, p. 126), em razão da riqueza da literatura infantil de Lobato e pelo
fato dele ter tido tanto sucesso com as crianças, formando leitores, todos os
brasileiros deveriam ter total intimidade com sua obra, seus livros deveriam
ser leitura obrigatória para todo e qualquer aspirante a professor de que
qualquer disciplina.
Para Aguiar (2001, p.
20-21), Monteiro Lobato foi o primeiro autor da literatura infantil brasileira
que deu voz às crianças através das personagens, reproduzindo o universo inquiridor
e imaginativo delas, desafiando-as a novas descobertas. Por meio de suas obras,
Lobato mostrou que a literatura infantil assegura o status de produção artística quando se vincula ao interesse e à
realidade do pequeno leitor. Isso somente ocorre por que o autor compreende que
não basta apenas falar sobre a criança a partir da sua posição de adulto que já
viveu essa fase da vida. É preciso colocar-se no lugar do leitor, ver o mundo
através de seus olhos, levando-o a ampliar esse olhar nas mais variadas direções.
Dessa maneira, Lobato
traz um espaço indefinido, um tempo indefinido, a criança como protagonista, o
humor, a crítica, a presença do adulto não como autoritarismo, mas como
elemento para dar verossimilhança à narrativa, já que crianças não podem viver
sozinhas, a formação de palavras, o enxugamento de descrições para um texto de
estilo mais direto em que também as protagonistas crianças têm voz e vez,
retira a parte cansativa, pedagógica que fazia com que o texto se arrastasse,
as personagem passam para uma dimensão mais afetiva, a perfeita harmonia entre
fantasia e realidade. Enfim todos esses aspectos e muitos outros que não
caberiam neste trabalho, podem ter contribuído para que o autor alcançasse o
sucesso que vem tendo durante todos esses anos com o público infantil.
Em razão de tudo que
foi dito, podemos dizer que Lobato tem muito a ensinar sobre o gosto do leitor
infantil, pois especialmente durante os anos vinte e trinta, houve uma
lapidação da sua obra, o que a tornou mais atrativa, fazendo com que ela
ultrapassasse os limites cronológicos e viesse a se tornar um clássico lido por
muitas gerações. Após a análise das obras que iniciaram e acabaram por definir
a estética da literatura infantil lobatiana podemos dizer que ainda há muito a
pesquisar, porém algumas considerações podem ser formuladas.
REFERÊNCIAS
AGUIAR, Vera Teixeira de (Coord.). Era uma vez... na escola: formando
educadores para formar leitores. 4ª. ed. Belo Horizonte: Formato, 2001.
ARROYO, Leonardo. Literatura infantil brasileira. São Paulo: Melhoramentos, 1968.
CABRAL, Izaura da Silva. O leitor em processo de autonomia:
contribuições de narrativas clássicas infanto-juvenis. Dissertação de Mestrado
apresentada ao PPG-Letras/UNISC, 2007.
CAVALHEIRO, Edgar. Monteiro Lobato: vida e obra. 3ª. ed. São Paulo: Brasiliense, 1962.
CHEVALIER, Jean; GHEERBRANT, Alain. Dicionário de símbolos. 12. ed. Rio de
Janeiro: José Olympio, 1982.
SANDRONI,
Laura. De Lobato a Bojunga. Rio de
Janeiro: Agir, 1987.
LOBATO,
Monteiro. A menina do narizinho arrebitado. Fac-símile da 1ª. ed. São
Paulo: Metal Leve/Forma Composições
Gráficas ltda., 1982.
_______________. A barca de Gleyre. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1944.
LOBATO,
Monteiro. “Narizinho Arrebitado”. In: Reinações
de Narizinho. São Paulo: Brasiliense, 2005.
MACHADO, Ana Maria. Como e por que ler os clássicos universais
desde cedo. Rio de Janeiro; Objetiva, 2002.
MAÇOLLA, Rosangela. As histórias de tradição oral na obra infantil de Lobato: análise
folkmidiática em Reinações de Narizinho. Rio de Janeiro: FOLKON, 2003.
MIGUEZ, Fátima. Nas
arte-manhas do imaginário infantil: o lugar da literatura na sala de aula.
4ª. ed. Rio de Janeiro: Singular, 2009.
NUNES, Cassiano. Monteiro
Lobato vivo. Rio de Janeiro: Mpm, 1986.
RODRIGUES,
Denise Reis; BORZUK, Cristiane Souza. Monteiro
Lobato e o construtivismo Piagetiano: a obra infantil de Monteiro Lobato
como suporte na prática pedagógica. XXV Congresso Nacional de Educação – CAJ/
UFG, 2009. Disponível em: www.revistas.jatai.ufg.br/index.php/acp/article/download/809/435
Acesso em 01/08/2011.
ZILBERMAN, Regina. Como e por que ler a literatura infantil brasileira. Rio de
Janeiro: Objetiva, 2005.
___________. A literatura infantil na escola. São
Paulo: Global, 2003.
www.lobato.globo.com/biblioteca_Geral.asp
Acesso em 15/07/2011
[1] De acordo Cavalheiro (1962, p.
417), o exame da companhia Editora Nacional, contudo, revela uma edição de
60.000 exemplares. Os arquivos pertenceram à Gráfica Monteiro Lobato. Segundo
Cavalheiro, Lobato distribuíra, num lúcido lance de propaganda, 500 exemplares
para escolas e grupos escolares do Estado de São Paulo.