Geraldo Generoso Ferreira
Mestre em Linguística Aplicada
pela UNITAU
Resumo:
O presente trabalho tem como objetivo analisar os Conteúdos Básicos Comuns do
estado de Minas Gerais observando a estruturação do nível enunciativo desse
documento. Por meio de uma análise linguístico-discursiva, buscamos observar as
instâncias enunciativas postas em cena em tal documento e a configuração das
vozes discursivas emergentes do texto. Como referencial teórico, tomamos por
base o interacionismo sociodiscursivo, ISD. Metodologicamente, partimos dos critérios de análise
e interpretação de textos postulados por Bronckart (2003), Machado &
Bronckart (2004), e Bronckart & Machado (2009). Os resultados apontam para
uma tentativa de ocultamento da instância enunciativa superior e para a
emergência de vozes, algumas vezes, dissonantes em termos ideológicos. O
estudo ainda aponta para a necessidade de refletirmos sobre como a análise do
nível enunciativo pode nos orientar sobre as representações veiculadas em
textos prescritivos
Palavras-chave:
Trabalho docente; Representação; Enunciação.
Introdução
Ao logo dos anos temos observado, na educação brasileira,
diversas reformas criadas pelos sucessivos governos, na tentativa de uma
modernização do sistema educacional. Essas reformas, contudo, nem sempre lograram
êxito e, consequentemente, incidiram no trabalho docente, reordenando-o e criando
novas configurações no exercício do métier.
Tais mudanças foram, de certa forma, concretizadas
por meio de leis e decretos, de cunho normativo, em busca de uma unificação da
estrutura organizacional da educação brasileira. Esses textos de caráter
prescritivo, em sua grande maioria, trazem em si uma pré-figuração do trabalho
e do agir docente, uma vez que neles é possível visualizar figuras
interpretativas das ações esperadas e apreendidas no contexto de trabalho. Ou
seja, de certa forma, trazem procedimentos sobre como devem portar os sujeitos
envolvidos no sistema educacional.
Um dos textos mais debatidos, e ainda em
vigência, no cenário brasileiro é a lei de diretrizes e bases da educação,
LDB1994/96, promulgada em 1996, durante o governo do presidente Fernando Henrique
Cardoso. O documento em questão e suas posteriores alterações trouxe consigo diversas
mudanças em relação às LBD anteriores, todavia, um de seus marcos foi a criação
de um currículo de base nacional também denominados de Parâmetros Curriculares
Nacionais, PCN, como forma de garantir aos estudantes, segundo o governo, conjunto de conhecimentos reconhecidos
como necessários para o exercício da cidadania. A LDB19394/96, previa, dentre
outras recomendações, que cada região teria a autonomia em adaptar as “sugestões”
contidas nos PCN, de acordo com as suas particularidades étnicas, regionais e
culturais.
Observando essa legislação, o governo do estado de
Minas Gerais criou, no ano de 2005, os Conteúdos Básicos Comuns. Tal documento,
também conhecido como CBC, tem como objetivo fornecer ao sistema estadual de
educação uma matriz curricular com conteúdos mínimos a serem aplicados nas
escolas da rede estadual, como forma de unificar, em certa medida, o currículo
no estado de Minas Gerais.
Esse documento tem sido amplamente questionado pelos
professores da rede já que o mesmo, na opinião de muitos professores, não
condiz com a realidade e as condições do sistema estadual de ensino. Outra
crítica recorrente de alguns docentes é em relação às lacunas, em termos de
conteúdos, referentes a algumas disciplinas, o que gera nos profissionais uma
desorientação e angústia frente ao trabalho.
Partindo dos problemas acima identificados sobre o
CBC, surgiu o nosso interesse em pesquisar sobre tal temática, buscando
analisar como o trabalho docente é representado nesse texto. Para tanto, partimos de
uma análise do nível enunciativo do texto em questão, observando as instâncias
enunciativas postas em cena no documento, as vozes presentes no texto e as
avaliações dos conteúdos temáticos realizadas pelo enunciador ao produzir o
documento.
Metodologicamente, partimos dos critérios de análise
e interpretação de textos postulados por Bronckart (2003), Machado & Bronckart
(2004), e Bronckart & Machado (2009).
O estudo está dividido em quatro partes: na
primeira, introduzimos a questão das reformas educacionais brasileiras e a
formulação de textos prescritivos no sistema educacional brasileiro. No segundo
tópico, observamos a criação dos Conteúdos Básicos Comuns do estado de Minas Gerais,
posteriormente, definimos o que é o nível enunciativo de um texto e suas
configurações, finalmente, passamos à análise dos dados e as considerações
finais sobre o estudo.
As reformas educacionais no Brasil e a formulação de textos prescritivos
As
primeiras tentativas de uma reforma educacional, com um aspecto modernista no
Brasil, tiveram início na década de 30, sobretudo, influenciadas pelas questões
sociais massivamente debatidas naquele período. Assim, grande parte dos
intelectuais e educadores acreditavam que uma mudança social efetiva dependia
de uma mudança em termos educacionais. Nasce, na visão de Shiroma (2000), a
concepção de escola como lugar da ordenação moral e cívica, da obediência, do
adestramento, da cidadania e da força de trabalho, quesitos indispensáveis para
a modernização do Estado. Nesse sentido, impulsionados pelo crescimento do
setor industrial no país, surgem as primeiras escolas técnicas responsáveis por
oferecerem um ensino técnico-profissional que atendesse às demandas de mercado
vigente naquele período.
Em
meados dos anos 40, com a promulgação da nova constituição, a educação ganha um
caráter universal como direito de todos e dever do Estado. Esse documento
expressa, de certa forma, uma inovação do que se tinha até então, ultrapassando
o ideário modernizador e instaurando um ideário liberal e democrático no país.
Como observa Hilsdorf (2005), os anos 50 são marcados pela mobilização social
em torno da educação. Contudo, na década de 60, temos a crise econômica e o
fortalecimento das forças conservadoras representadas principalmente pela
igreja católica. Em tal período, observa-se um retrocesso nas conquistas
adquiridas no campo educacional, o que irá se intensificar no regime militar
(1964-1985). Ainda segundo Hilsdorf, no período militar, há um rebaixamento no
padrão de escolarização da população brasileira em que a taxa de analfabetismo
passa a ganhar destaque mundial, colocando o Brasil entre os piores índices.
Com
a abertura política, deu-se início à chamada democratização do ensino, em que,
de acordo com Shiroma (2000), buscava-se defender a educação pública e gratuita
como direito público subjetivo e dever do Estado. Tem-se ainda a defesa pela
erradicação do analfabetismo e a formação do aluno crítico. Tais questões foram
amplamente debatidas nos anos 90, mas sua implantação trouxe consequências
colhidas até o momento, devido às políticas implantadas nesse processo de
reforma.
Gentili
(1999) observa que, “em tal política econômica, tem-se o progressivo desmantelamento
do estado como agência produtora de bens e serviços e como aparelho
institucional orientado a garantir e promover os direitos da cidadania”
(GENTILI, 1999, p. 106). Sob o argumento de que tais reformas eram necessárias
para o desenvolvimento do país e, consequentemente, para a diminuição da
pobreza refletida nas desigualdades sociais, os governos subsequentes
fortaleceram o discurso sobre essa necessidade como única via para o
desenvolvimento do Brasil.
Neste
contexto, a redefinição do papel do estado se reflete na estrutura educacional
brasileira, que transfere para a esfera do mercado, negando sua condição de
direito social, transformando-a em uma possibilidade de consumo individual,
variável segundo o mérito e a capacidade dos consumidores (GENTILI, 1998 apud
MALACHEN; VIEIRA, 2005).
Desse
modo, a reforma educacional, na perspectiva neoliberal, tem seu início com a
elaboração do Plano Decenal de Educação, PDE, no governo Itamar Franco, sendo
posteriormente, implementado por FHC. Tal reforma se alinhava aos acordos
internacionais firmados em eventos como a Conferência Mundial de Educação para
Todos, em que os governantes de 155 países se comprometeram a garantir uma
educação Básica de qualidade. Cabe ainda salientar que o Plano Decenal de Educação
para Todos seguiu orientações de organismos internacionais como UNESCO e BIRD,
que também foram responsáveis por grande parte do financiamento desse projeto.
A análise desses organismos sobre a realidade
da América Latina e Caribe era de que a crise na educação era uma crise de
eficiência, eficácia e produtividade do sistema. Sendo, assim, sua superação
estava baseada em mecanismos corretivos baseados no mercado. É nesse momento,
segundo Gentili (1998), que a educação passa a ser concebida como uma oportunidade
e não mais com um direito.
Outro
aspecto a ser salientado nessa perspectiva, seguindo a linha capitalista, é a
adaptação dos homens à exigência da nova ordem mundial. A capacitação de
recursos humanos para atender às demandas de competitividade internacional
estava baseada na produtividade e qualidade de bens e produtos, ou seja, a
educação necessariamente deveria corresponder às necessidades reguladas pelos
mercados capitais.
A
concretização dessa ideologia neoliberal vai ser delineada, na prática
educacional via leis, decretos, resoluções, pareceres, ou seja, atos
normativos, ou melhor, via textos de caráter prescritivo que orientarão o
trabalho educacional nos diversos níveis e estruturas de ensino. Como exemplo,
podemos citar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, LDB 9394/96, considerada
um marco da reforma educacional nos anos 90, responsável pelas principais
mudanças ocorridas no sistema. Entre as várias mudanças, podemos destacar as
reformas no ensino superior quanto à formação docente e à Educação a Distância.
Outro texto de caráter prescritivo de grande importância na reforma foram os
Parâmetros Curriculares Nacionais (1998), PCN, que buscaram reorientar a
construção dos currículos na Educação Básica de forma geral.
Como
nosso trabalho enfoca um texto oriundo desse documento, fazemos a seguir uma
relação entre o PCN e o Currículo Básico Comum de Minas Gerais, CBC.
De
acordo com o artigo 26º da LDB 9.394/96:
Art
26º Os currículos de ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum,
a ser complementada em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por
uma parte diversificada exigida pelas características regionais e locais da
sociedade da cultura, da economia e da clientela.
Essa
base nacional comum é a espinha dorsal que os estados e municípios devem
observar na construção de seus currículos particulares. Os PCN foram formulados
a partir de uma discussão em âmbito nacional nos anos de 1995 e 1996 com a
participação de docentes de diversas universidades, bem como técnicos e
especialistas das secretarias estaduais e municipais de Educação.
Posteriormente, esse documento foi reelaborado tendo sua versão final publicada
em 98.
É
interessante observar que a reforma educacional que culminou, entre outras
coisas, na elaboração deste documento, tem suas origens numa rede ideológica
discursiva que, sustentando os relatórios apresentados pelos organismos
internacionais, buscava convencer o público sobre a necessidade de tal reforma
sob argumentos como altos índices de evasão e de repetência, inadequações dos
currículos às novas configurações de ciência tecnologia, métodos de ensino
arcaicos, formação precária dos docentes etc. (MACHADO, 2004).
Aliado
a esses e a outros argumentos, estava o uso de vozes de autoridades em didática
de diferentes disciplinas, o que causava na população a impressão de consenso
sobre tal reforma, ou seja, ocultava-se o papel do estado que, na elaboração
desse currículo, buscava controlar as ações educativas. Machado (2004),
observando tal estratégia, conclui:
Assim, a elaboração de uma base curricular
comum para todas as escolas do país é o gesto fundador de controle pelo Estado
da qualidade de ensino desejada, ao qual se seguiu a implementação de uma série
de mecanismos de avaliação nacional, tanto em relação aos instrumentos
utilizados pelos professores (por exemplo, pelo Plano Nacional do Livro de
Didático) como em relação às competências adquiridas pelos diferentes alunos de
diferentes níveis de ensino, pela implementação de um conjunto de exames (SAEB,
ENEM, Provão) (MACHADO, 2004, p.143)
O
texto de caráter prescritivo, nesse sentido, ganha o poder não só de direcionar
as ações do sujeito, seu trabalho, bem como pode controlá-lo, empregando, no
caso da educação, ações de cunho ideológico, tanto nos trabalhadores quanto nos
outros envolvidos nessa atividade.
É
dentro desse contexto ideológico-discursivo maior e correlacionando os textos e
reformas acima mencionados que se dá a criação da proposta curricular mineira,
também conhecida como Conteúdos Básicos Comuns, CBC.
A
criação dos Conteúdos Básicos Comuns
A
criação dos Conteúdos Básicos Comum, CBC, tem seu início a partir do
desenvolvimento do projeto Escola-Referência criado no ano de 2004, como o
objetivo de assegurar a todos o direito à educação de qualidade em Minas Gerais. Esse
projeto era composto por 223 escolas estaduais participantes da reestruturação
da educação básica em
Minas. Entre as reformas educacionais propostas nesse
projeto, estava a criação de um núcleo curricular comum nas escolas públicas
mineiras nos níveis fundamental e médio da Educação Básica, inspirado
principalmente no texto prescritivo anterior, em Nível Nacional , os
PCN.
Assim,
a Secretaria de Estadual de Educação, SEE/MG, criou um projeto intitulado
Programa de Desenvolvimento Profissional de Educação, PDP, com o objetivo de
capacitar os educadores para o exercício profissional nas diversas áreas de
atuação. Como forma de implementar tal projeto, criaram-se os grupos de
desenvolvimento Profissional, GDP, compostos por, no máximo, catorze educadores
em cada escola. Esses grupos eram responsáveis por debater e discutir as
propostas curriculares preliminares elaboradas por especialistas contratados
pela SEE/MG. Tais propostas foram debatidas durante os anos de 2004 e 2005 entre
os professores dessas escolas-referência, membros dos GDP, chegando-se a uma
primeira versão das propostas curriculares em 2005.
A
partir de sua implementação, ele passou a ser obrigatório nas disciplinas
curriculares em todas as escolas do estado de Minas Gerais. Dessa forma,
criaram-se os Conteúdos Básicos Comuns, CBC. O documento trata, na verdade, de
uma matriz de competências básicas para a avaliação do sistema público de
ensino em que se estabelecem, em cada tópico, as habilidades básicas a serem alcançadas
pelos alunos e trabalhadas pelos professores. Trata-se também de um referencial
para as avaliações externas pautadas no ideário neoliberal de “qualidade e
eficiência” tão cultivado pelo Estado, como já vimos anteriormente.
A
organização do CBC em
Minas Gerais , como já dissemos, foi produzida por
especialistas de cada disciplina, contratados pela SEE/MG, ou seja, apesar de
serem experts nos temas abordados,
eram pessoas externas ao dia a dia do sistema educacional estadual mineiro, o
que, de certa forma, está em concordância com as críticas apontadas por Machado
(2004) sobre os textos prescritivos oriundos de documentos oficiais, em que a
autora observa que tais prescrições são geralmente elaboradas por agentes
externos e impostas aos professores.
No
caso específico do CBC de Língua Estrangeira, material de nossas análises, tal
documento foi elaborado por uma professora pesquisadora da Universidade Federal
de Minas Gerais, doutora na área e com mais de 20 anos de docência no ensino
superior. A docente em questão tem uma extensa produção científica na área de
material de didático em Língua estrangeira, incluindo também a organização de
livros didáticos de Inglês para o Ensino Fundamental e Médio. Assim como nas
demais disciplinas que compõem o CBC, é a Professora que assina a autoria do
texto relativo ao currículo da disciplina de língua inglesa e não o governo de
Minas Gerais.
O quadro abaixo traz a
estruturação do plano global do documento, a partir do qual fizemos uma análise
do nível enunciativo, seguindo os critérios teóricos-metodológicos
desenvolvidos por
Bronckart (2003), Machado & Bronckart (2004), e Bronckart & Machado
(2009).
Quadro 1-Plano
global do CBC de LE do ensino fundamental
Seções
do documento
|
Conteúdos
tematizados
|
Introdução
|
Embasamento da Proposta curricular
|
Razões para se ensinar LE
|
Justificativa da proposta
|
Diretrizes Gerais para o ensino de LE
|
Justificativa do uso da abordagem
comunicativa
|
As quatro habilidades comunicativas:
Algumas considerações
|
Habilidades comunicativas enfocadas na
proposta
|
Novas tecnologias e o ensino de LE
|
Uso de sites e programas computacionais
|
Critérios para a seleção de conteúdos
|
Temas a serem trabalhados no ensino de LE
|
Orientações Pedagógicas
|
Ações metodológicas a serem empregadas no
Ensino de LE
|
Conteúdo Básico Comum (CBC) de Língua
Estrangeira do Ensino Fundamental da 6ª a 9ª. Série - Eixo Temático
|
Eixos temáticos a serem abordados
|
Bibliografia
|
Referências utilizadas no documento
|
No
tópico seguinte, passamos ao nível enunciativo em que buscamos apresentar a
estrutura e os mecanismos de responsabilização dos enunciados em análise, essa
estruturação do texto favorece, de certa forma, a interpretação linguístico-discursiva de outros níveis que podem ser estudados como
o nível organizacional e o nível semântico, por exemplo.
O nível enunciativo
De acordo com Bronckart e Machado (2009), “a
análise do nível enunciativo do texto incide sobre os mecanismos de
responsabilização enunciativa em geral, cujo grau é marcado por um grande
número de unidades linguísticas” (BRONCKART e MACHADO, 2009, p.58). Trata-se,
na verdade, de mecanismos que atuam na manutenção da coerência pragmática do
texto, evidenciando posicionamentos enunciativos como:
Quais instâncias assumem o que é enunciado
no texto?
Quais as vozes expressas no texto?
Quais as avaliações expressas?
Podemos perceber que tais mecanismos têm uma
relação estreita com a progressão temática e, por isso, Bronckart também os denomina
mecanismos configuracionais, entre os
quais destacamos, em nosso trabalho, as marcas de pessoa, as marcas de inserção
de vozes, os modalizadores de enunciado e os modalizadores subjetivos e
adjetivos.
A identificação das marcas de pessoa em um
texto tem, por finalidade, mostrar como o enunciador é posto no agir
representado textualmente, ou seja, como se constrói o processo de enunciação a
partir do seu posicionamento. É comum observarmos, por exemplo, em relatos
interativos, a mesclagem entre os dois planos enunciativos em que o enunciador,
muitas vezes, se divide entre um “eu” referente ao enunciador da interação
atual, o momento presente, e um “eu” referente a uma interação situada num
passado remoto ou não.
Outro ponto observado é quanto à alternância
dos pronomes pessoais (eu, nós, a gente) que colocam em cena o estatuto individual
e coletivo atribuído a determinado agir. Assim, ao analisar um enunciado como:
“Eu trabalho para melhorar as
condições sociais de minha comunidade” é, em termos de agir, diferente de “Nós trabalhamos para melhorar as
condições sociais de nossa comunidade”, ou ainda “A gente trabalha para melhorar as condições sociais de nossa
comunidade.”
No primeiro enunciado é visível um agir
posto pelo enunciador-actante, de caráter individual. Nos dois últimos,
percebemos um agir coletivo que, se analisado de acordo com um contexto
particular em que tais enunciados são postos, podemos perceber um agir
coletivo, mais restrito ou mais amplo (BRONCKART e MACHADO, 2004).
Analisar a presença ou ausência de vozes num
texto incide em mobilizarmos, muitas vezes, representações que tais vozes
veiculam, principalmente, quando elas vêm apagadas, sendo sua recuperação
apenas possível via pressuposição e aos implícitos. Mesmo em situações em que
as vozes aparecem de maneira explícita, é comum termos sua responsabilização dirigida
a outrem, dependendo da situação argumentativa em questão.
Nesse sentido,
devemos conceber o autor de uma ação de linguagem a partir de sua alteridade
constitutiva, como postula Authier–Revuz (1982). Em concordância com essa
autora, Bronckart observa que:
Quando empreende
uma ação de linguagem, o autor mobiliza, do vasto conjunto de conhecimentos de
que a sede, subconjuntos de representações que se referem, especialmente, ao
contexto físico e social de sua intervenção, ao conteúdo temático que nela será
mobilizado e a seu próprio estatuto de agente (capacidades de ação, intenções,
motivos). Como todos os conhecimentos humanos, essas representações são
construídas na interação com as ações e com os discursos dos outros e, mesmo
quando são alvo de uma reorganização singular, resultante da dimensão
experiencial própria de cada pessoa, continuam portando os traços dessa
alteridade constitutiva (BRONCKART, 2003 p. 321).
Dessa forma,
explicitar as vozes de um texto é, consequentemente, explicitar as representações
de um agir postas pelo enunciador, identificando os possíveis confrontos ou
embates ideológicos em um mesmo plano discursivo.
A análise dos organizadores argumentativos e
as unidades de negação e asserção (DUCROT, 1987) têm contribuído para a explicitação
das vozes em diversos tipos de texto. Pesquisas desenvolvidas pelo grupo ALTER têm
mostrado que, em textos produzidos por instâncias governamentais, essas
unidades de negação e asserção são mais comuns. Nota-se também que o uso da
negação e asserção é comum como recurso argumentativo, implicando o apagamento
de vozes contrárias ao posto pelos enunciados Assim, em “A saúde pública no Brasil não deve ser relegada a um segundo plano”
tem-se a existência de uma voz pressuposta que considera a saúde pública
relegada a um segundo plano, e que é negada pelo produtor. Esse exemplo mostra,
ainda, as visões diferentes de um mesmo objeto temático, ou seja, a saúde
pública no Brasil, e, consequentemente, as posturas frente ao agir configurado
por elas a partir das vozes que as tematizam.
As modalizações, de uma forma geral, buscam
evidenciar os comentários ou avaliações sobre o conteúdo temático feitos pela
instância enunciativa. Elas podem ocorrer em qualquer nível da arquitetura
textual e buscam, pelo estabelecimento da coerência temática, orientar o seu
destinatário na interpretação deste conteúdo. Bronckart observa que, apesar das
diversas classificações propostas desde a antiguidade, ele, inspirado na teoria
dos três mundos (objetivo, social e subjetivo) criada por Habermas (1987),
redefine as modalizações a partir de quatro funções. Assim, temos as
modalizações lógicas, as deônticas, as apreciativas e as pragmáticas, todas já
explicadas no capítulo1 deste trabalho.
Nessa seção, porém, queremos ressaltar a subjetividade
posta na modalização, para isso recorremos aos estudos de Kerbrat-Orecchioni
(1993), nos quais a autora divide a linguística da Enunciação a partir de dois
enfoques: o ampliado e o restrito. No caso do ampliado, a linguista observa que
sua finalidade é descrever as relações que se estabelecem entre o enunciado e
os diferentes elementos do quadro enunciativo. A linguística da enunciação
restrita, por usa vez, busca analisar apenas o sujeito da enunciação. Nesse
trabalho, nos valemos, particularmente, dessa última perspectiva, já que
buscamos compreender também como o sujeito enunciador se configura frente ao
seu enunciado e ao agir nele representado.
Para Kerbrat-Orecchioni (1993), as escolhas
lexicais são responsáveis por deslizamentos de sentido, e os vocábulos que dão
suporte a essas escolhas são os nomes substantivos e adjetivos de caráter,
muitas vezes, axiológicos, ou seja, avaliativos. A autora, utilizando-se do
termo subjetivema, o define como “unidades significantes
cujo significado comporta o traço subjetivo e cuja definição semântica exige a
menção de seu utilizador”. Para analisar esses subjetivemas, a autora divide as
unidades linguísticas como os substantivos, adjetivos, advérbios e verbos,
explorando o traço de subjetividade de cada um.
Os substantivos apresentam-se em duas formas
afetivos e avaliativos e são, segundo Kerbrat-Orecchioni, derivados de verbos
ou adjetivos. Eles revelam uma avaliação do sujeito enunciador e podem variar
de uma enunciação para outra, sendo eliminados em discursos com pretensões de
objetividade e ocorrendo com abundância em discursos com pretensões
avaliativas.
No que se refere aos adjetivos, eles
transitam segundo a autora, numa escala significativa do mais objetivo para o
mais subjetivo. Como nosso interesse é pelas marcas de subjetividade,
trataremos aqui apenas dos adjetivos subjetivos, que por sua vez, se subdividem
em afetivos e avaliativos, sendo os avaliativos reagrupados em axiológicos e não
axiológicos.
Os adjetivos afetivos estão relacionados à
reação emocional do enunciador frente ao objeto temático, ou seja, implicam um
engajamento afetivo. Os adjetivos avaliativos não axiológicos apenas apresentam
uma avaliação qualitativa ou quantitativa do substantivo, não atribuindo valor
nem engajamento afetivo. Os axiológicos, ao contrário, apresentam tanto a
avaliação qualitativo-quantitativa, bem como expressam o juízo de valor ao
substantivo. Essa dupla subjetividade, contudo, dependerá das intenções
ideológicas e argumentativas do sujeito da enunciação e dos objetivos
enunciativos em relação ao objeto temático e ao destinatário.
Os advérbios também seguem as subdivisões
estabelecidas para os adjetivos e podem revelar, entre outros, julgamentos de
verdade por expressões do tipo talvez, sem dúvidas, com certeza etc. ou ainda
julgamentos quanto à realidade. Ex: verdadeiramente, efetivamente etc. Sua
importância básica, porém, está no fato de expressarem a intervenção do
enunciador sobre o conteúdo temático.
A importância da análise e do levantamento
dessas unidades linguísticas, em qualquer discurso, está no fato de elas
marcarem a presença do enunciador e orientarem o sujeito destinatário a
determinadas conclusões ou interpretações do objeto temático e,
consequentemente, do agir nele configurado.
Assim, buscamos, em nosso trabalho, levantar
tais unidades, observando em que medida seus enunciadores se utilizam para
reconfigurar o agir docente e o trabalho do professor no documento em estudo.
Análise do nível enunciativo do CBC de Língua Estrangeira
A responsabilização daquilo que é enunciado nos
textos, de formal geral, é caracterizado pelo Interacionismo Sociodiscursivo, ISD,
como mecanismo enunciativo. Como vimos, Bronckart (2003) observa que esse
recurso é responsável pela coerência pragmática do texto. Nesse sentido,
buscamos analisar, no CBC, de que forma as avaliações foram construídas nos
conteúdos temáticos e, ao mesmo tempo, buscamos apontar as vozes constituintes
em tal documento.
Como sinalizado no tópico a criação dos Conteúdos
Básicos Comuns, o documento tenta, de certa forma, ocultar a instância
produtora de tal texto via autoria designada, ou seja, a especialista
contratada pela SEE-MG para elaboração do documento e que o assina. Nesse
sentido, podemos dizer que o material analisado comporta dois níveis de
enunciação. O primeiro é formado a partir do contexto institucional de origem
do texto, isto é, o governo de Minas Gerais como produtor primário responsável
pelo documento. O segundo nível da enunciação é o nível em que a autora
empírica, a especialista contratada pela SEE-MG, por meio da construção
textual, se dirige aos seus interlocutores imediatos (professores de LE da rede
estadual de ensino).
Essa organização da instância enunciativa, em si, já
pressupõe a existência de, pelo menos, duas vozes na constituição do texto.
Contudo, pelo seu caráter prescritivo, observamos a tentativa de apagamento não
só dessas como de outras vozes emergentes do documento. É interessante
observarmos que no texto quase não aparecem as vozes explícitas dos teóricos
nos quais o enunciador se embasou para produzir o documento. Esse apagamento
pode levar o leitor menos familiarizado com as teorias expostas a atribuir ao
enunciador a responsabilidade do que é dito, ou seja, a autoria dos enunciados.
O uso predominantemente do discurso teórico é uma das
características desse gesto de ocultamento da instância enunciativa.
Entretanto, como ressalta Bronckart (2003, p. 321), “todo texto procede de um
ato material de produção de um organismo humano e, como toda ação humana, essa
intervenção comportamental está em estreita interação com o acionamento de um
conjunto de representações, que estão necessariamente inscritas nesse mesmo
organismo”. Dito de outro modo, todo texto é produzido por um sujeito cujas
representações discursivas são construídas e reelaboradas a partir do meio
social e das experiências vivenciadas pelo processo interacional ali
constituídos.
Na introdução, temos a presença explícita de um texto
com o qual o documento dialoga:
Esta proposta se encontra
fundamentada na legislação brasileira vigente, em consonância com a Lei de
Diretrizes e Bases (1996), e segue os Parâmetros Curriculares Nacionais –
Língua Estrangeira - 5ª - 8ª séries (BRASIL, 1998) e os Parâmetros Curriculares
Nacionais: Ensino Médio (BRASIL, 1999). Na legislação brasileira atual, é
obrigatória a inclusão de uma língua estrangeira no currículo a partir da 5ª
série, sendo que uma segunda língua estrangeira pode ser incluída como
opcional. No Ensino Médio, a língua estrangeira deve ser obrigatoriamente
incluída na parte diversificada do currículo (MINAS GERAIS, 2005, p. 11).
Esse trecho aponta para um texto também de caráter
prescritivo, produzido por uma instância superior à qual o sujeito produtor se encontra
subordinado. Assim, o presente documento, ao mesmo tempo, se legitima e se
subordina a uma fonte superior que o autoriza e o respalda a enunciar o que
nele é expresso. O uso do verbo “segue” no trecho em recorte denota a
subordinação de tal documento, bem como expõe seu caráter prescritivo.
Outro ponto observado é quanto ao uso recorrente da
voz passiva frente às ações propostas pelo documento como forma de ocultamento
dos sujeitos dessas ações:
Sugere-se a
inclusão de mais de uma língua estrangeira ao longo de toda a Educação Básica
(da 5ª série ao 3º Ano do Ensino Médio) (MINAS GERAIS, 2005, p. 11).
Saliente-se que a
aprendizagem de língua estrangeira contribui para o processo de formação integral
do aluno e representa muito mais do que uma mera aquisição de formas e
estruturas linguísticas em um código diferente. (MINAS GERAIS, 2005, p. 12).
Recomenda-se que a
tarefa de escrita corresponda a situações reais de interlocução e que contenha
especificações relativas às condições de produção: a que gênero pertence o
texto que vai ser produzido, incluindo sua função comunicativa básica; o
contexto e o público-alvo ao qual o
texto será dirigido (MINAS GERAIS, 2005, p. 41).
Desse modo, não é mencionado o agente responsável
pelo que, por exemplo, é sugerido ou recomendado. Todavia, como leitores,
podemos atribuir essas ações ao sujeito produtor do enunciado, no caso, a
autora. Para Bronckart (2003), instaura-se nesse domínio a instância geral de enunciação
configurada na ordem do EXPOR pelo expositor. Essa instância também é
responsável por gerenciar as demais vozes do texto.
No recorte seguinte, temos um conflito gerado pelo
embate de duas vozes dissonantes, se considerada a instância de produção
institucional originária do documento:
Embora esse seja um
direito assegurado ao aluno da educação básica, a Escola Pública da Rede
Estadual ainda não oferece as condições necessárias para o desenvolvimento
adequado de habilidades comunicativas na língua estrangeira, configurando-se o
cenário atual em termos das seguintes características: número de horas reduzido
a, no máximo, duas horas de aula por semana; desvalorização da disciplina em
relação a outras consideradas mais “nobres e importantes”; turmas numerosas,
sem possibilidade de formação de subgrupos; material didático pouco adaptado ao
contexto do aluno e à situação de aprendizagem; carência, na maioria das vezes,
de material de suporte, como, por exemplo, salas-ambientes, gravadores, vídeos,
biblioteca especializada, acesso à Internet, entre outros (MINAS GERAIS,
2005, p. 12).
Na passagem acima, percebe-se a presença de uma voz
que critica a rede estadual de ensino quanto à falta de condições necessárias
para o ensino de LE, contudo, devemos lembrar que a autora do documento é uma
pesquisadora contratada pelo governo para atender aos seus interesses na
produção dos Conteúdos Básicos Comuns.
Assim, ao tecer tais críticas, percebe-se o
surgimento da voz da autora que, apesar de estar “representando” textualmente a
voz do governo, não consegue manter-se totalmente filiada a essa instância
ideológica, deixando “escapar” a sua voz de pesquisadora e professora
universitária. Segundo a análise do discurso de linha francesa (cf. PÊCHEUX,
1997), temos, no exemplo, um embate de vozes de formações discursivas
diferentes, em que, num primeiro momento, a partir do contrato, a autora se
filia a instância governamental e ao criticar esse sistema, emerge o discurso
da professora pesquisadora que analisa de forma crítica o sistema educacional
em debate. É, portanto, a partir desse “deslize” que se explicita, no texto, a
emergência de outras vozes.
As modalizações também
constituem parte dos mecanismos enunciativos. Elas traduzem, a partir de
qualquer voz enunciativa, os diversos comentários ou avaliações formuladas a
respeito de alguns elementos do conteúdo temático (BRONCKART, 2003). No
documento em estudo, visualizamos um grande número de modalizações do tipo
lógicas, como apontado a seguir:
Essencial é a noção de aprendizagem como um processo dinâmico em que o
aluno participa ativamente, questionando, fazendo uso de seu conhecimento
anterior, desenvolvendo estratégias de aprendizagem e assumindo um maior
controle e uma posição crítica em relação ao que está sendo aprendido (MINAS GERAIS, 2005, p. 11).
É necessário
ainda que sejam asseguradas as condições necessárias ao desenvolvimento de
habilidades comunicativas para o uso do(s) idioma(s) estrangeiro(s) (MINAS
GERAIS, 2005, p. 12).
É certo que
o aluno do Ensino Fundamental e Médio possui conhecimento genérico sobre as
situações e eventos habituais do dia a dia armazenados na memória de longo
prazo (conhecimento prévio ou enciclopédico) (MINAS GERAIS, 2005, p. 20).
Tais modalizações apontam para o caráter objetivo das
avaliações do conteúdo(s) temático(s) uma vez que são vistos a partir de suas
condições de verdade, como fatos essenciais, necessários e certos. Apesar
dessas características e do grande número de incidência no texto analisado,
Bronckart (2003) observa que não há uma relação direta entre os tipos de
discurso e as unidades de modalização. A frequência no uso dessas unidades,
segundo o autor, parece estar mais relacionada ao gênero do que ao tipo de
discurso.
Ainda no que tange às formas modalizadoras, no texto
é recorrente o uso do modal “poder” que tem um caráter ilocucional/perlocutório
de “dever” em razão da instância enunciatva de origem do texto estabelecida
pela relação hierárquica de poder entre enunciador (governo) e destinatário
(professores). Assim, em trechos como:
As atividades de
compreensão podem também levar o aluno a comparar as opiniões ou pontos
de vista em dois textos sobre o mesmo tema. Ele pode ainda ser
incentivado a criar tabelas, diagramas e mapas conceituais que demonstrem
compreensão do texto lido (MINAS GERAIS, 2005, p. 37).
As expressões grifadas ganham um caráter ilocucional
de “devem levar” e “deve ser”, se observarmos que a função de tal documento
institucional é orientar o professor a “agir” (planejar e ministrar suas aulas)
de acordo com os tópicos expressos no CBC.
Essa estratégia discursiva via modalização constitui
também uma forma de polidez[1]
em que o enunciador busca suavizar o teor imperativo de seu enunciado por
formulações mais indiretas. Desse modo, a ordem, que é um ato particularmente
ameaçador para as faces daquele a quem se destina, ganha um caráter menos coercivo
via modalização, distanciando a realização de um ato problemático.
Da mesma forma, a ausência de modalizações,
denominada de grau zero, também
exerce um papel importante na avaliação do conteúdo tematizado, como um efeito
de verdade incontestável ou pressuposto naquilo que é enunciado, sendo também
um gesto de apagamento da marca de subjetividade.
No trecho abaixo, temos a incidência dessa estratégia
ilocucional:
Os benefícios da capacidade de comunicação
em diferentes línguas estrangeiras são inestimáveis no mundo globalizado do
século XXI (MINAS GERAIS, 2005, p. 12).
A asserção acima é feita na ausência de unidades
modalizadoras, o que a torna, dentro do contexto de interação do discursivo
teórico, uma verdade absoluta não passível de contra-argumentos. Porém, se
atentarmos criticamente para o enunciado, podemos, como leitores, questionar a
veracidade de tal afirmação e até mesmo sinalizar controversas, como, por
exemplo, o enfraquecimento identitário-cultural de um povo (BROWN, 1980) ou a
alienação cultural que certas formas de ensino e aprendizado de LE podem causar
nos aprendizes (MOITA-LOPES,1996). Todavia, a forma como o enunciado acima foi
construído orienta o leitor para o efeito de sentido de uma verdade única
expressa no texto.
Considerações
Finais
O presente trabalho teve como objetivo analisar os Conteúdos
Básicos Comuns do estado de Minas Gerais observando a estruturação do nível
enunciativo desse documento. Por meio de uma análise lingüístico-discursiva,
observamos que o texto busca, de certo modo, apagar a instância enunciativa de
cunho governamental, apresentando como autora do documento uma especialista
contratada pelo governo. Tal estratégia produz no texto a emergência de vozes,
em alguns momentos, dissonantes que se materializam nos enunciados.
Outro ponto observado no documento é o uso
predominante do discurso teórico como forma de reforçar o apagamento das instâncias
enunciativas e, ao mesmo tempo, emitir avaliações sobre os destinatários do
texto. O uso e a ausência de modalizadores nos enunciados também pode
demonstrar a tentativa de ocultamento da responsabilização dos dizeres, no
documento, como forma de levar o leitor à determinadas conclusões sobre o conteúdo
temáticos.
Assim, podemos dizer que o presente estudo chama-nos
atenção para a necessidade de refletirmos sobre como a análise do nível
enunciativo em documentos prescritivos pode nos orientar sobre as
representações veiculadas nesses textos.
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[1] Segundo
Kerbrat-Orecchioni (2006), a polidez, em sentido amplo, refere-se a todos os
aspectos do discurso que são regidos por regras cuja função é preservar o
caráter harmonioso da relação interpessoal.